Gênesis 48

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O autor registra a publicação da benção de Jacó sobre seus filhos, garantindo que o povo de Deus perceba a extensão das bênçãos do pacto reservadas àqueles que foram chamados para desfrutarem da salvação prometida a Abraão, Isaque e Jacó.

Notes
Transcript
“Este é o livro das gerações ...” (Gênesis 5.1).
Gênesis 48
Pr. Paulo Ulisses
Introdução
Continuando a conclusão da saga patriarcal, o autor narra o anexo de Manassés e Efraim como sendo participantes da benção pactual jungida ao nome de Jacó, tal como aconteceu com seu pai, Isaque, e com o pai deste, Abraão. O contexto de progressão da benção pactual, como visto ao longo da própria narrativa dos patriarcas, serve de indicativo transicional entre seções do escrito, indicando que a história dos atos redentivos do SENHOR se desenrolarão a partir do protagonismo de outro(os) personagem(ns).
De acordo com o que é apresentado no capítulo 48, a iminência da morte de Jacó (v. 1) enseja o cuidado do patriarca em tornar notória a história redentiva que guia sua jornada. Tanto o capítulo 48 quanto o 49 fazem parte da cena em que uma espécie de "benção-testamento" é pronunciada sobre os filhos de Israel, e esse proferimento se encarrega de exibir o quadro geral da benção do SENHOR, cumprida através de Jacó( até este ponto), e também, o que acontecerá ao povo de Deus - representados pelos filhos de Israel - ao longo dos tempos em relação ao propósito restaurador pronunciado pelo próprio Criador quando entrou em Aliança com Abraão, Isaque e Jacó.
O texto não aponta uma substituição direta, isto é, Manassés e Efraim não são contados diretamente como filhos de Jacó, no sentido estrito do termo, mas receberão parte na benção de seu avô. A razão para isso é que Israel vê nos filhos de José uma referência ao cumprimento da aliança abraâmica:
Gênesis 48.3–5 RA
Disse Jacó a José: O Deus Todo-Poderoso me apareceu em Luz, na terra de Canaã, e me abençoou, e me disse: Eis que te farei fecundo, e te multiplicarei, e te tornarei multidão de povos, e à tua descendência darei esta terra em possessão perpétua. Agora, pois, os teus dois filhos, que te nasceram na terra do Egito, antes que eu viesse a ti no Egito, são meus; Efraim e Manassés serão meus, como Rúben e Simeão.
A preservação da calamidade provida pelo SENHOR ao ter guiado o patriarca ao Egito, é vista por Jacó de uma perspectiva peculiar: mesmo não tendo esperança de ver novamente o rosto de José, lhe é concedido ver tanto a face deste quanto as de seus netos: "disse Israel a José: Eu não cuidara ver o teu rosto; e eis que Deus me fez ver os teus filhos também" (Gn 48.11). Essa noção faz com que Jacó reconheça esses fatos a partir de uma união conceitual entre benção e pacto - algo já feito por Abraão e Isaque anteriormente - de maneira que uma será a resultante do cumprimento divino da outra, garantindo a pavimentação do percurso histórico que preservará todo o povo de Deus, levando-o ao ápice da redenção: o triunfo do Deus Triuno por meio de seu Messias, outorgando ao povo a herança prometida.
Porém, esse aspecto progressivo da benção pactual é explicitado por Jacó de maneira ainda mais vivaz, no modo como realiza a divulgação dessa mesma benção: a disposição dos filhos de José (i.e. o mais novo precedendo o mais velho) retrata sua própria história, quando foi destacado no lugar de Esaú como sendo o alvo do favor divino no lugar daquele que seria naturalmente escolhido por ser o primogênito. A fé de Jacó, de que o Deus de seus pais seria com sua linhagem depois que ele morresse, ganha ainda mais evidência através do destaque de Efraim sobre Manassés.
Assim, a temática da presente seção, tal como apresentada pelo redator consiste em expor a continuidade da benção pactual como penhor do cumprimento da promessa redentiva.
Elucidação
A expressão inicial "passadas estas coisas", progride o enredo para uma nova seção ou cena, e como o contexto demonstra, a partir da enfermidade de Jacó, o autor exibe que está adentrando a conclusão de mais uma seção do livro, no caso, a última, pois como demonstrado em Gn 37.2: "Esta é a história de Jacó".
No capítulo seguinte, a demarcação temporal "depois" sugere o mesmo efeito, introduzindo agora o anúncio da benção sobre seus filhos de fato. Assim, embora o tópico de anúncio de benção conecte as duas seções (e.g. Gn 48 e 49), ambas possuem desdobramentos pontuais e peculiares, levando o leitor/ouvinte a considerá-las sequencialmente.
A narrativa está estruturada em dois blocos concêntricos: a primeira parte (vs. 1-10) introduz a doença de Jacó e a intenção deste em abençoar José através de seus respectivos filhos. O segundo bloco (vs. 11-22) concentra-se no relato da benção proferida propriamente dita, e a interpretação que Jacó faz quanto ao final da saga redentiva, explicando assim a primazia de Efraim sobre Manassés.
O destaque dado ao contexto do episódio serve novamente como preparação para a conclusão da saga patriarcal. A doença de Jacó (devido a idade avançada) faz com que os leitores esperem que certos acontecimentos - análogos aos que ocorreram com os próprios patriarcas no passado - se repitam. Antes de morrer, Abraão providenciou que a linhagem santa prosseguisse, fazendo com que seu servo trouxesse de sua terra natal, uma mulher que demonstrasse a mesma fé sua, quando saiu de Ur (cf. Gn 24). Isaque, também farto de dias, mesmo tendo intentado alterar a ordem anexa à palavra profética deferida por Deus à Rebeca, quando esta consultou ao SENHOR por causa da tensão que sentia no ventre devido a gravidez dos gêmeos, publicou quem seria o portador da benção divina, e portanto, o protagonista da saga redentora, abençoando Jacó no lugar de Esaú (cf. Gn 27.1-40).
Não por acaso Moisés destaca a aproximação do fim dos dias de Jacó: agora, vendo o cumprimento da aliança abraâmica que o tornara fecundo e numeroso, é hora de transmitir a benção pactual aos seus descendentes, como é visto nos versos de 3 a 5.
Como mencionado, o anexo de Manassés e Efraim como beneficiários da benção patriarcal, conecta os episódios da chegada e estada de Jacó no Egito ao fluxo narrativo-progressivo da execução dos propósitos redentores, tal como revelados desde Abraão. As experiências vivenciadas por José e Jacó desde o capítulo 37, quando aquele é vendido como escravo e trazido ao Egito, não estão fora dos planos do Criador em abençoar seu povo, como já ficou evidente por meio da própria saga de José. A ênfase final que Jacó deseja comunicar é que sua estada na terra do Egito está diretamente ligada ao propósito do cumprimento da salvação divina para com seu povo, de maneira que seus filhos deverão enxergar sua permanência nessa terra (estranha terra) como uma continuidade dos intentos do Criador em redimir seus eleitos.
Essa percepção se tornaria mais clara quando o próprio povo oriundo de Israel se multiplicasse, e visse o Criador, com mão poderosa e braço estendido, ferir o Egito afim de livrá-los da servidão e guiá-los à Terra Prometida a seus pais (Abraão, Isaque e Jacó).
O Deus que se apresentou a Jacó em Luz (cf. v.3) e nomeou-se como "o Deus de Abraão, teu pai, e Deus de Isaque" (cf. Gn 28.13), estenderia sua benção aos filhos de José, como prova de que estaria com seus descendentes, dando-lhes o gozo de serem chamados filhos de Deus (v.16).
A partir desse ponto, o autor descreve o pronunciamento da benção de Jacó sobre os filhos de José. Porém, outro destaque peculiar é feito pelo autor: no momento em que está para abençoar Manassés e Efraim, Jacó cruza os braços, erguendo a mão direita sobre o mais moço, e a esquerda sobre o mais velho:
Gênesis 48.13–14 RA
Depois, tomou José a ambos, a Efraim na sua mão direita, à esquerda de Israel, e a Manassés na sua esquerda, à direita de Israel, e fê-los chegar a ele. Mas Israel estendeu a mão direita e a pôs sobre a cabeça de Efraim, que era o mais novo, e a sua esquerda sobre a cabeça de Manassés, cruzando assim as mãos, não obstante ser Manassés o primogênito.
Essa atitude é muito peculiar para que tenha sido realizada por Jacó (e registrada por Moisés) impensadamente. Certamente o desejo do patriarca nesse gesto é replicar ocorrido consigo e com seu pai, Isaque, no passado, em que o mais novo (ou segundo filho), foi destacado em relação ao irmão mais velho (ou o filho primogênito), como confirma John Walton:
"Nas narrativas patriarcais, o filho mais novo recebe um tratamento privilegiado em cada geração: Isaque recebeu a herança em detrimento de Ismael, e Jacó, em detrimento de Esaú; José foi favorecido em relação aos seus irmãos e agora Efraim é favorecido em relação a Manassés" (WALTON, 2018, p.94).
O próprio Israel explica a razão da troca das mãos sobre os filhos de José:
Gênesis 48.17–20 RA
Vendo José que seu pai pusera a mão direita sobre a cabeça de Efraim, foi-lhe isto desagradável, e tomou a mão de seu pai para mudar da cabeça de Efraim para a cabeça de Manassés. E disse José a seu pai: Não assim, meu pai, pois o primogênito é este; põe a mão direita sobre a cabeça dele. Mas seu pai o recusou e disse: Eu sei, meu filho, eu o sei; ele também será um povo, também ele será grande; contudo, o seu irmão menor será maior do que ele, e a sua descendência será uma multidão de nações. Assim, os abençoou naquele dia, declarando: Por vós Israel abençoará, dizendo: Deus te faça como a Efraim e como a Manassés. E pôs o nome de Efraim adiante do de Manassés.
Esse curso de outorga de benção sobre o mais novo, caracteriza a história do povo de Deus em relação à saga redentiva, e consequentemente, toca o ponto de preservação e segurança exposto por Moisés, tal como crido pelo próprio Jacó: Israel sempre será o menor, mais fraco ou pequeno em relação às circunstâncias, inimigos ou ameaças, porém, não será da força de seus braços ou de seus atributos e capacidades que virá o livramento, e sim da fidelidade do SENHOR e do mantenimento de sua benção sobre seus eleitos.
É válido notar que, nas ocorrências anteriores, em que o mais novo foi erguido sobre o mais velho, uma rivalidade inerente fez parte da trama. Não é o caso em Gênesis 48, pois, diferentemente do que acontece com Isaque e Ismael, em que o primeiro recebe a benção pactual e o segundo não, e de igual forma com Jacó e Esaú, Efraim e Manassés partilham do favor do SENHOR manifesto através da benção da aliança que Israel declarara. O ponto é que a dinâmica "fraqueza-força" da saga redentiva está sendo fixada como padrão para a história do povo de Deus, como já elucidado.
Isso assegura a graça do Criador em fazer com que seu povo goze das benesses do pacto, mesmo que se veja frente à alguma ameaça ou tribulação, e essa segurança fica clara na própria declaração de Israel:
E abençoou a José, dizendo: O Deus em cuja presença andaram meus pais Abraão e Isaque, o Deus que me sustentou durante a minha vida até este dia, o Anjo que me tem livrado de todo mal, abençoe estes rapazes; seja neles chamado o meu nome e o nome de meus pais Abraão e Isaque; e cresçam em multidão no meio da terra (Gn 48.15–16).
Peculiarmente, a menção que Jacó faz da benção que declara sobre seus filhos/netos alude à pessoa de José, salientando que, a partir dessa benção, José receberá uma porção maior de bênçãos que seus irmãos (cf. "Dou-te, de mais que a teus irmãos" (v.22)), exceto Judá, que desfrutará do destaque messiânico, tal como foi adiantado em 38.27-30; 43.9 e 44.32-33).
Transição
A seção é encerrada com outra promessa, assumindo dessa vez um caráter profético: "Eis que eu morro, mas Deus será convosco e vos fará voltar à terra de vossos pais" (Gn 48.21). O duplo alcance do registro sacramenta uma verdade a ser crida tanto por José e seus irmãos, quanto pelo povo de Deus que agora recebe o registro da presente narrativa: O Deus que os levou ao Egito a fim de os livrar, os tirará de lá, e fará com que vejam a salvação do SENHOR finalmente. Considerando no que criam Abraão, Isaque e Jacó, um terceiro horizonte se descortina: o ápice da promessa era que o povo torna-se "à terra de vossos pais", mas essa terra não era a extensão geográfica chamada Canaã, mas o lar glorioso, a pátria celestial, tantas vezes enfatizada por Moisés como sendo a herança dos patriarcas prometida à descendência de Abraão (cf. Gn 12.7).
Analisando o texto a partir dessa perspectiva, o princípio elencado pelo autor divino/humano direcionado ao povo de Deus, pode ser sintetizado no seguinte ponto:
Aplicação
A benção pactual transicionada de Jacó para os filhos de José, alude a fruição dessa mesma bênção sobre toda a descendência de Abraão, o que inclui a igreja do SENHOR hoje.
Se nos lembrarmos bem da palavra profética direcionada pelo próprio Deus a Abraão em Gn 12.2, veremos que a multiplicação da descendência do patriarca estava diretamente ligada a demonstração da benção do SENHOR sobre ele:
Gênesis 12.2 RA
de ti farei uma grande nação, e te abençoarei, e te engrandecerei o nome. Sê tu uma bênção!
Em Gn 48, Jacó é testemunha disso: vendo a multiplicação de sua casa, constata que o Criador cumpriu o que havia dito a seu pai Abraão, e como forma de demonstrar sua fé no mesmo Deus, publica essa benção sobre José, Efraim e Manassés, fazendo com que os dois últimos estejam também debaixo da graça da Aliança.
O teor central da benção de Jacó sobre Efraim e Manassés baseia-se em dois benefícios dos quais todos os outros serão desfrutados: segurança e multiplicação.
Em relação à segurança, Moisés confirma por meio do texto, que o povo de Israel obterá do SENHOR a proteção necessária a fim de que chegue ao lugar destinado pelo próprio Criador como sendo o ponto de culminância de seus planos:
"[…] O Deus que me sustentou durante a minha vida.... […] o Anjo que me tem livrado de todo mal..."
Isso ligado à "troca de mãos", abençoando o mais novo sobre o mais velho, declara que, embora os eleitos de Deus pareçam menores, mais fracos ou indefesos diante de seus adversário e tribulações, estão debaixo da poderosa mão do Criador, que os levará à salvo ao lugar de seu descanso.
Quanto a multiplicação, o que se depreende dessa noção abençoadora vista por Jacó em seus pais, é que o avanço da glória de Deus por meio do chamamento de seus eleitos à salvação não é uma possibilidade, mas uma certeza. Também conectado à benção abraâmica, o SENHOR havia dito que nele "serão benditas todas as famílias da terra" (Gn 12.3b). A graça divina, inexoravelmente, estabelecerá a descendência de Abraão: os filhos (espirituais) da aliança se multiplicarão, até que de todos os confins da terra, as doze tribos de Israel transformem-se numa multidão incontável (Ap. 7.9).
Conclusão
Israel viu em seus netos o cumprimento da aliança do SENHOR com Abraão, e alegrou-se, revigorando sua fé no Deus Redentor. Se diante dos dois filhos de José, Jacó foi tomado por essa profunda convicção, muito mais nós, a igreja do SENHOR, sendo também frutos do pacto divino, podemos aguardar com confiança que o nosso Deus, em seu Cristo, guiará a multidão de seus eleitos, à salvo, para o Novo Céu e Nova Terra… para a herança de Abraão, Isaque e Jacó.