Gênesis 11.1-9

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Moisés demonstra o avanço da iniquidade e rebelidão dos homens, e também o plano salvífico de Deus por meio não somente da soberania do Criador sobre as nações (Gn 10), mas também, especificamente, através dispersão dos homens sobre a terra, como marco inicial do movimento salvador para a proclamação da glória de Deus sobre toda a criação.

Notes
Transcript
“Este é o livro das gerações ...” (Gênesis 5.1).
Gênesis 11.1-9
Pr. Paulo Ulisses
Introdução
O trecho em questão é o recorte explicativo do capítulo anterior que salienta a divisão das nações descritas antes, "cada qual segundo a sua língua, segundo suas famílias, em suas nações" (Gn 10.5). Também enfatiza o desenvolvimento da narrativa da intensificação e expansão da natureza pecaminosa do homem em rebelião contra Deus, e as medidas redentivas empreendidas pelo Criador para livrar seu povo tanto da contaminação (i.e. mistura entre as linhagens), quanto do juízo iminente que derramará sobre os ímpios.
Por meio desse texto, Moisés demonstra o avanço da iniquidade e rebelião dos homens, e também o plano salvífico de Deus por meio não somente da soberania do Criador sobre as nações (Gn 10), mas também, especificamente, através dispersão dos homens sobre a terra, como marco inicial do movimento salvador para a proclamação da glória de Deus sobre toda a criação.
Elucidação
Como temos visto, o livro de Gênesis submete vários subtemas à uma metanarrativa que se sobrepõe à história como um todo, dando o movimento de progresso dos planos de Deus em salvar seu povo eleito. Estamos no último capítulo que demarca a história pré-patriarcal, e como não poderia ser diferente à luz do que temos visto, mais um episódio de conflito aparece como sendo parte do siclo de "criação-queda-redenção" que monta o cenário para o auge que é a chegada do descendente prometido - Cristo.
Como já demonstramos em sermões anteriores, Gênesis registra a avalanche de pecado e rebelião contra Deus, permeada pela graça do SENHOR em sempre escolher e retirar para si seus eleitos, providenciando que o juízo recaia sobre os culpados, e a graça brilhe sobre os favorecidos.
Desta feita, Moisés encerra a narrativa da história antiga com a descrição de como os planos dos homens em arquitetar meios de voltar-se contra Deus é frustrado pela soberania divina, e de como o próprio Criador usa isso para benefício do seu povo. Assim, poderemos observar a passagem de Gênesis 11.1-9 a partir da seguinte estrutura: A rebelião dos homens contra o plano salvífico de Deus: a confusão das línguas como marco do progresso do plano redentivo.
Em primeiro lugar, o texto elucida a sanha dos homens em unir-se contra Deus, num projeto egocêntrico.
1. As intenções rebeldes dos homens: 1 - 4.
O anseio humano em reunir-se, evitando a dispersão, além de ser alimentado por uma vanglória idólatra, demonstra ser um levante que se opõe contra as intenções de Deus de que sua glória cubra toda a terra, como as águas cobrem o mar.
Segundo Carlos Osvaldo:
A tentativa unificada da humanidade de resistir à ordem de Deus de se espalhar por toda a terra, por meio da construção de uma cidade para celebrar sua própria glória, é subvertida por Deus por meio da confusão da linguagem (11.1–9).
1. A humanidade estabelecera-se em uma única região, Sinear, e vivia unida por falar uma única língua (11.1).
2. O orgulho humano leva os homens a construir uma cidade grandiosa, com uma torre magnífica, de forma a ratificar que aquele local seria sua habitação imutável e que seu destino pertencia a eles mesmos (11.2–4).
3. A resposta do Senhor ao perigo imposto pela unidade humana em rebelião e pelo orgulho é a subversão de sua unidade, por meio da confusão do diálogo humano, e a dispersão dos homens por toda a terra (11.5–8).
4. Babel foi o local onde Deus reduziu o orgulho humano a mero barulho, e a unidade humana, à dispersão (11.9) (Carlos Osvaldo Cardoso Pinto, Foco & Desenvolvimento no Antigo Testamento, org. Juan Carlos Martinez, 2a Edição Revisada e Atualizada (São Paulo: Hagnos, 2014), 38–39).
Além, do mais precisamos compreender o que significa de fato a construção da torre de Babel. Tal empreendimento não é simplesmente uma obra de construção civil qualquer, mas de acordo com registros antigos, os historiadores apontam que a torre em questão era na verdade um zigurate, construção antiga reservada quase que exclusivamente aos deuses (Comentário HIstórico-Cultural da Bíblia, p. 47-48). Isso, aliado ao fato de que o intento dos homens era "tornar célebre o nome deles (v.4) indica que a pretensão em questão é afrontar Deus por meio de algum tipo de arrogância idólatra em almejar o próprio status de divindade ou, reverenciar outro deus além do SENHOR.
Se considerarmos a crescente onda de pecado e depravação em que marcha a humanidade, observaremos que a inclinação idólatra esteve presente e fora exposta especialmente através de alguns personagens que encabeçaram rebeliões contra o Criador: A proposta da serpente para Adão (Gn 3.5 (i.e "sereis como Deus...")); a crueldade de Lameque (Gn 4.24). O erigir de uma torre cujo topo toque os céus serve para os homens como alento para seus corações pagãos e rebeldes, quando tentam roubar a glória de Deus, atraindo-a para si maquinando o mal.
A expressão repetida "vinde, e façamos"exibe o conselho dos ímpios em opor-se a tudo o que Deus ordena. Por outro lado, o autor, usa a mesma expressão para designar a ação divina em julgar e condenar esse os projetos dos homens: "Vinde, desçamos e confundamos […]" (Gn 11.7). O que nos leva ao nosso segundo ponto.
2. O juízo divino e a antítese da vontade soberana de Deus: 5 - 9.
Diante da malignidade dos homens, Deus intervém frustrando seus planos. Porém, para além de uma simples punição, a divisão das línguas em Babel, precisa ser observada através do escopo maior do plano redentivo de Deus para o seu povo eleito, o que demarca o "modus operandi" do Criador para cumprimento de seus propósitos.
Assim como a maldade dos homens havia se espalhado sobre a terra (Gn 6.5) o que acarretou o dilúvio, que por sua vez foi usado pelo Senhor para a salvação dos eleitos (i.e. Noé e sua família, com exceção de Cam), da mesma forma, Babel e sua pecaminosidade é usada como propulsor do progresso do plano salvífico.
A glória de Deus estava sofrendo a oposição do orgulho e arrogância dos homens, que buscavam concentrar-se num único lugar, ao invés de cobrirem a terra. Em razão disso, Deus "desce" (linguagem antropomórfica) para examinar as ações dos homens. Essa expressão é um paralelo à Gn 3.8-10 quando relata que Deus veio ao encontro do homem, no momento em que este havia comido do fruto proibido. Naquele episódio, a vinda do Senhor até o ambiente onde o pecado havia sido executado, demonstra a intenção divina em julgar os transgressores, instaurando um tribunal onde o Adão seria punindo seu pecado. De igual forma, a descida do Criador sobre Babel, também pode ser vista como a chegada do juiz à cena do Crime, a fim de que o culpado seja punido.
A sentença escolhida por Deus é a de que os homens serão, a despeito de seus intentos, dispersos sobre a terra, e para isso, o Criador confunde a linguagem, o que é uma medida constrastante tendo em vista a expressão do verso 6: "Isto é apenas o começo; agora não haverá restrição para tudo que intentam", ou seja, Deus tenciona impedir que o pecado dos homens cresça ainda mais.
Contudo, a confusão dos idiomas em Gênesis 11.7, também possui o propósito duplo de operar simultaneamente bênção e maldição. A divisão dos idiomas promoveu a expansão dos povos para outras partes do planeta, criando a partir disso uma dispersão que gerou culturas, costumes e povos com hábitos completamente diferentes. Essa diversificação é fortuita para o avanço da narrativa bíblica, pois enfatiza o alcance dos planos de Deus tratando não apenas do povo de Israel, que foi usado pelo SENHOR como luz para as nações, mas também inclui gentios, ou seja, eleitos de Deus oriundos de outras partes da terra, o que por sua vez contribui para a compreensão de que a salvação, visto não estar condicionada ou confinada a uma cultura ou povo, não possui como critério de contemplação qualquer bem ou mérito dos homens, mas unicamente a obra regeneradora e graciosa de Deus, que chama para si aqueles a quem elegeu desde antes da fundação do mundo. Assim, o texto de Gênesis 11.1-9 reforça o caráter de abrangência global da salvação em Cristo Jesus.
O evento paralelo e antitético à divisão de línguas, é o Pentecostes, quando, por obra do Espírito Santo, pessoas de várias nações e povos, são abençoados ao ouvir que galileus (i.e. judeus interioranos) são capacitados sobrenaturalmente a falar nas línguas nativas dos naturais daqueles povos registrados em Atos 2.7-12 . Se lá, o SENHOR unifica seus eleitos, demonstrando-lhes que cumpre as promessas de redenção por meio de Cristo, enviando o consolador para que o povo de Deus fosse reunido pela pregação do Evangelho, isto deve-se ao fato de que aqui, na dispersão dos povos em Babel, o SENHOR dá mais um passo aos seus planos de redimir para si um povo.
Transição
Antes de Gênesis 11.1-9 ser apenas uma episódio que expõe toda pecaminosidade dos homens, por trás das intricáveis desventuras dos rebeldes, está a mão grandiosa de Deus, mais uma vez regendo a história para o cumprimento de sua obra redentora.
Aplicações
O texto de Gênesis 11.1-9 demonstra como a história avança, mesmo sob vistas do levante dos homens contra Deus, de acordo com os planos redentivos do Criador. Porém, ao nos debruçarmos sobre o texto, percebemos que há implicações para a além dessa conclusão.
1. O coração dos homens é naturalmente avesso a vontade Deus.
Claramente, as ordens do Criador desde o momento da criação dos homens, tal como é adiantado em Gênesis 1.28, e repetido medianta a aliança noética Gênesis 9.7, eram de que toda a terra deveria estar cheia da glória de Deus através da multiplicação dos homens (depois da queda, através dos eleitos). Porém, a narrativa do presente texto clarifica para nós a tendência natural do coração dos homens e se haver contra esta ordenança divina.
No afã de atrair glória para si, o homem se afasta cada vez mais dos princípios que Deus determinou que fossem seguidos, tanto para o seu próprio bem, quanto para alcance dos objetivos do próprio SENHOR. Mas há no coração do homem um desprazer em servir ao Criador que também está presente no coração dos próprio eleitos. Às vezes buscamos nossa própria vontade, sem levar em consideração o quanto nosso coração é enganoso e desesperadamente corrupto (Jeremias 17.9). Precisamos nos policiar quanto aos nossos desejos. Os homens em Babel, afrontavam a Deus em sua tentativa de erger para si uma cidade, um templo que pudessem unificá-los em um só intento: desafiar o Criador. É possível que nosso coração esconda o mesmo objetivo por trás de coisas aparentemente justificáveis. O empreendimento pode ser muito atrativo para nós, mas se viola as Leis de Deus; se vai contra as ordenanças do SENHOR, não passa de anseios malignos que para nada servem, se não para nos movermos em desagrado ao nosso Deus.
Deus julga o orgulho. Quão ímpio e rebelde é o coração natural do homem! Não muito tempo depois do dilúvio, o homem estava se rebelando de novo. Nosso coração sempre se afasta naturalmente do amor e da graça do Senho em busca de nossso próprios esquemas de autoexaltação. Mas esses esquemas sempre nos colocam em oposição aos propósitos de Deus e conduzem à frustração e desonra (Nota da Bíblia de Estudo Herança Reformada, p. 26).
2. Os planos do SENHOR serão executados, através inclusive da rebeldia dos homens.
Não podemos crer que Deus é apanhado de supresa ao longo do percurso da história. À luz do texto anterior, vimos o quanto o Criador é soberano sobre todas as nações da terra, mostrando sua intenção de extender a salvação à todas elas. Neste texto porém, que tanto revela um aprofundamento da devasidão e perfídia dos homens, também vemos o quanto a mão providente de YHWH articula os próprios meios através do quais seu nome será glorificado. Enquanto os homens estavam tramando uma revolta contra Deus, o próprio SENHOR havia providenciado que por meio disso, os homens seriam dispersos, e assim, o surgimento das nações revela a abrangência da soberania de Deus em salvar indívudos de todos as tribos, línguas e nações.
Da mesma sorte, precisamos sempre ter em mente que o transcorrer da história está nas mãos de nosso SENHOR, e não somente o fim do percurso. Isso encoraja-nos a ver o mundo de uma maneira otimista, muito embora o quadro pareça sempre obscuro: nada ocorrerá fora dos padrões ou decretos de Deus. Essa informação, longo de alimentar em nós algum tipo de apatia, nos impulsiona a servir ao Criador de maneir amais diligente, pois sabemos que estamos sendo usados como instrumentos através dos quais, Deus há de levar à cabo seus planos de glorificar seu nome na redenção da criação.
Tendo isso em mente, nossa postura frente a como lidamos com os planos de Deus é crucial.
3. Devemos nos acautelar, para conhecer e agir de acordo com a vontade de Deus.
Voltar-se contra os planos do SENHOR, é assinar uma sentença de punição certa. Embora os planos de Deus estivessem concorrendo sobre o levante em Babel, isso não escusou os homens do castigo divino por estarem violando as ordens do Soberano. Da mesma sorte, a compreensão de que os planos do SENHOR são executados sempre, deve inspirar em nós o zelo de fazer tudo de conformidade com aquilo que ele nos revelou. Não há discrepâncias entre a vontade revelada e os decretos divinos.
A Bíblia apresenta que em algumas circunstâncias, algumas ações dos servos de Deus foram vistas como excessões à regra, e através de suas ações o SENHOR agiu soberanamente para o cumprimento de sua vontade. Exemplos disso são a mentira das parteiras em Êx 1; o fato de Moisés ter matado os próprios israelitas após estes pecarem adorando o bezerro de ouro Êx 32 e etc. Embora nesses casos planos de Deus estavam sendo executados à excessão da regra, como vemos também aqui em Gênesis 11.1-9, nos encontramos nenhuma passagem bíblica que nos encorage a assumir posturas contrárias a vontade de Deus ativamente.
Estar de acordo com os planos de Deus, é agir de maneira obediente à sua Palavra. Por meio de Gênesis 11.1-9, Moisés exortou o povo de Israel a confiar nos planos de Deus, pois mesmo onde poderia parecer que o pecado haveria de prosperar, tudo estava de acordo com os decretos divinos para o favorecimento do povo eleito do SENHOR por meio da salvação que agora estava se dispersando por toda a terra, e mesmo aqueles que pareciam inimigos audazes (por terem intentado algo tão inusitado como a construção de uma torre que tocasse os céus), a afronta dos rebeldes é facilmente confundida.
4. Cristo é aquele que reune todos os eleitos de Deus em um único povo.
O plano do SENHOR não são é divisão, distância ou separação, mas é de união, concentração. Porém, diferente do que foi pensado pelos rebeldes em Babel, a glória pertence somente ao SENHOR, e um nome célebre somente o Criador possui. Por isso suas intenções foram aniquiladas e seus projetos, desbaratados.
Mas, por meio do texto lido, vemos que Moisés apontou para o povo de Israel, que tudo contribui para o estabelecimento da vontade soberana de Deus em unir seu povo, debaixo de sua graça eletiva. Em Jesus Cristo, somos reunidos de todos os povos, línguas, tribos e nações sob a bandeira de seu Reino eterno.
Conclusão
Em Babel, os povos são dispersos a fim de que a glória de Deus através de seus eleitos, brilhe sobre toda a terra. Em Cristo, eleitos de todos os povos são reunidos sob uma só coroa, declarando a redenção majestosa executada pelo Deus Triuno.