Reorientando o coração em oração (Salmo 43)

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Introdução

Este salmo provavelmente estava junto ao salmo 42, o primeiro do Livro II, e não possui título, o que é incomum nesta coleção. Estes salmos compartilham temas como de luto, opressão (Sl 42.9, 43.2) e desejo da presença de Deus (Sl 42.2; 43.4), formando um salmo de lamentação individual. O salmista luta para confiar em Deus em meio a seu sofrimento. Buscando a intervenção de Deus (Sl 43.1-2), o salmista imagina sua alegria em ir diante de Deus no templo (Sl 43.3-4).
O contexto aponta uma situação injusta provocada por uma nação ímpia que deseja deliberadamente contenda e por um possível homem fraudulento. Essa nação já está afligindo sofrimentos ao salmista, ao ponto de ele lamentar (v. 2). É um sofrimento real e presente causado por forças externas. O pedido de livramento do salmista acerca desse homem acusador pode não ter alguém [um nome e cpf] em vista, mas um tipo de pessoa que ele sabe, por experiência, que gera muitos males [NAA: “dessa gente”. Pode ser um livramento para o futuro, mas é provável que represente uma quantidade de homens inimigos que o cercavam (v.2).

Exposição

1. Olhando pro lado e pedindo justiça

Por conta de toda aflição sofrida o salmista faz um apelo legítimo: que o senhor lhe faça justiça. Sua linguagem é típica de quem confia na aliança de Deus e em seus termos (Jr 2.9; Mq 6.1; 7.9). Como diz João Calvino, “temos uma evidência do triunfante testemunho de sua sã consciência, nisto: que ele deposita a defesa de sua causa na mão divina” João Calvino, Salmos, 2009, p. 265). É fonte de consolação saber que Deus age favoravelmente em justiça aos seus filhos.
O salmista parece encontrar dificuldades de conciliar a verdade de que Deus é sua fortaleza com a tribulação enfrentada. A explicação para ele é que Deus o rejeitou (Sl 13.1-2; Sl 22.1). Ele não perde de vista a soberania de Deus, onde não há outra explicação última para sua situação, senão que Deus a permitiu. Mas daí, em coragem, o salmista pergunta por que o Senhor o rejeita. Por que ele andaria prateando sob humilhação inimiga.

2. Olhando para Deus e pedindo louvor

I A palavra reorienta o coração

O salmista parece perceber (v. 3) que sua perspectiva das coisas está equivocada. Que, embora seu pedido seja legítimo, ele está enxergando a situação de forma embaçada. Pede, então que Deus envie sua luz e verdade [expressões para a presença do Senhor, Sl 18.28, Jó 29.2-3 Sl 27.1, e a Palavra do Senhor, Pv 6.23]. Melhor escolta que essa não existe (Sl 23.6).
A bússola do seu coração estava apontando para o local errado, mas ele não apela ao seu coração para ir ao caminho correto. Não adianta somente dizer: “coração, conserte-se”. É necessário que a Palavra o faça. É necessário que a luz da Palavra de Deus e sua verdade ilumine e instrua o coração vacilante. A oração do salmista sai para o pedido de mudança exterior para o pedido de mudança interior, e quem faria isso seria o próprio Deus através de sua voz.
a) Orientação para o louvor
Se olhamos somente para os aspectos da queda que nos cercam, nossas orações acabam sendo apenas petições. Se não olhamos para Deus, perdemos o aspecto doxológico (adorador) da relação com Deus. Importa que Deus seja louvado, pois somente Ele é digno de ser. O refúgio do salmista não seria mais de Deus enviar providência em sua direção, mas, antes, que ele seja enviado ao encontro com Deus (“me guiem e me levem ao teu santo monte, aos teus tabernáculos”, v. 3). Aplicando outras palavra, a reviravolta do salmista é “Senhor, eu perdi os olhos de ti, me leva para tua presença novamente”.
Seu objetivo era ir ao altar de Deus, sua morada, e realizar sacrifícios de louvor (gratidão e ações de graças). Isso pois em Deus está a sua alegria (“de Deus, que é a minha alegria”, v. 4). A Palavra de Deus guia à Sua presença (v. 3) e lá encontramos alegria que leva inevitavelmente ao louvor (v.4). Ao que parece sua harpa estava no canto, como objeto de decoração. Enquanto ele olhava apenas para o seu sofrimento ela empoeirava. Mas ele agora sabe que Deus é louvável em qualquer circunstância. Se algo o impedia de louvar era exatamente porque, por um instante, ele pensou que Deus era domesticável, alguém que viveria para atender a sua vontade.

3. Olhando para si e reorientando o coração

I Auto-pessimismo saudável

A fé nos ensina a não sermos muito otimistas conosco mesmos.
a) O refrão contra e a favor de si mesmo
O salmista retoma o refrão do salmo 42. Ele se volta contra si mesmo para agir a favor de si. Sim, muitas vezes a melhor forma de se ajudar é se confrontar. Muitas vezes a melhor forma de se consolar em meio ao sofrimento é gritar para si e dizer “Por que estás abatida, ó minha alma? Por que te perturbas dentro de mim? Espera em Deus, pois ainda o louvarei, a ele, meu auxílio e Deus meu”. O salmista anuncia para si memórias que lhe mostram quem Deus é e que não há sofrimento que dure para sempre se estamos esperando e confiando em Deus. O pensamento de que “eu posso louvar a Deus no santuário apesar do sofrimento” revitalizou o salmista.

Aplicações

Aplicação 1: Soberania que conforta

Não nos desespera saber que Deus tem o controle de absolutamente tudo. Deveria ser desesperador se a realidade fosse outra: que Deus não tem esse controle. Que coisas podem lhe escapar às mãos. Que existem coisas que Deus não pode evitar ou que mesmo não as conhece.

Aplicação 2: No sofrimento, Deus é Pai.

Meus irmãos, Deus não é um mago. No sofrimento, não experimentamos apenas a providência de Deus e os seus milagres. Tribulações são momentos de busca genuína de refúgio. Não são momentos de apenas pedir: “Pai, resolve”. São momentos semelhantes à nossa infância, quando entrávamos em apuros e corríamos para os braços de nossos pais ou mães em busca de socorro e abrigo, sabendo que poderíamos confiar que “esse problema ele ou ela sabe resolver”.
Precisamos aprender com Cristo a ter confiança no Pai. Em meio às tentações e à fraqueza da carne, Cristo escolheu sempre se submeter à vontade do Pai. Haviam outras rotas, mas na cabeça de Jesus só existia a via da obediência. E ele lutou sempre em oração. Na profunda agonia, Cristo procurou o Pai em oração (Mt 26.38). Não houve sofrimento, inclusive de uma multidão de homens maus, que o impedisse de se dirigir diretamente aos braços do Pai.

Aplicação 3: Precisamos de objetivos últimos

Uma reflexão que o salmista nos traz é que ele, em determinado momento de sua oração, recordou muito bem onde queria chegar. Seu objetivo de vida. Acho que nunca se falou tanto em objetivos como em nossa época pós-moderna, onde as pessoas geralmente não os tem [conscientemente]. Faltam respostas para os “por quês” e para os “para quês”? Para onde sua empresa vai? Por que você vai fazer faculdade? E por que essa em específico? Por que você vem à igreja? Qual o propósito da sua vida? Bem, um objetivo final é importante para todas as coisas. Nós modelamos os recursos para alcançá-lo. E o objetivo final de nossas vidas nunca deve ser perdido de vista: glorificar a Deus e ter alegria nele para sempre. O sofrimento entrou como um painel que o impediu de ver a glória de seu Deus. Mas quando ele recupera o fôlego e seu coração não está mais dividido, foi como se ele lembrasse: “quem pode me separar do amor de Deus? O sofrimento?”

Aplicação 4: Seu Cristianismo não deve ser muito otimista consigo mesmo.

Sêneca uma vez falou assertivamente: “algumas vezes, seja duro consigo mesmo” [Cartas de um Estoico]. Algumas vezes é necessário se confrontar e questionar os próprios atos e sentimentos. Outras vezes é necessário lançar pessimismo sobre nós mesmos, para que não acreditemos ser “essa coca-cola toda”.
Por isso, olhemos para Cristo. Nosso otimismo está nele. O cristianismo não é uma religião ranzinza. Você poderia até pensar nisso por causa de doutrinas como o pecado ou a depravação total. Mas há Cristo. Se devemos ser pessimistas conosco, devemos ser otimistas com Cristo. Ele é nosso salvador e mediador. Ser otimista com Ele é se apropriar da sua obra infalível em nosso favor, nos concedendo salvação e liberdade. A esperança do evangelho deve ser somada à tristeza.

Aplicação 5: O salmista não sabia, mas viria o Salvador nos amar em meio às dores

Cristo é um salvador que sofreu. Ele mesmo foi experimentado em sofrimento. Nós seguimos o crucificado. E, embora Cristo não nos livre de todo sofrimento, ele nos acompanha em todos (Hb 4.14,15). O sofrimento não tem o mesmo significado para os crentes.
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