Gênesis 6.9-22

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O progresso da história redentora agora é afunilada por Moisés focando um personagem específico, sobre o qual está posto o desenvolvimento do plano salvador de Deus para com seu povo.

Notes
Transcript
“Este é o livro das gerações ...” (Gênesis 5.1).
Gênesis 6.9-22
Pr. Paulo Rodrigues
Introdução
Como exposto no item anterior, o trecho analisado expande a compreensão em relação a continuação dos planos de Deus em redimir o seu povo eleito como fora profetizado. É possível então observar o direcionamento realizado pelo autor em esclarecer para o seus leitores como todo o plano salvífico progride desde a queda, e embora aparentemente, a corrupção e progressão do pecado também acompanhem a história, as intenções de Deus serão concretizadas.
Há de se notar também que, através disso, todo o viés didático-teológico elaborado por Moisés movimenta a atenção dos leitores do texto de Gênesis para a expectativa que deve ser criada no aguardo da manifestação do ente prometido. Embora diversos outros temas estejam sendo abordados de maneira subtópica, a espera do Messias pode ser destacada como o grande tema-chave do livro de Gênesis, isso através do progresso genealógico da semente da mulher ao longo dos tempos.
Elucidação
De acordo com o que foi exposto no prólogo desse texto (Gn 6.1-8), é introduzido à narrativa do desenvolvimento do povo de Deus conforme está sendo demonstrado a Israel por Moisés, o tema da redenção para o cosmo – o que alcança de maneira especial os eleitos do SENHOR – através do derramamento de juízo e punição contra o pecado que havia se infiltrado e se alastrado na humanidade (Gn 4.8-16, 17-26; 6.1-7). Entretanto, não podemos perder de vista o foco por meio do qual a operação de Deus em razão desse objetivo se processa, isto é, o modo usado pelo Criador para promover o relacionamento entre ele e seu povo, sendo o veículo que proporciona o anúncio de suas promessas e o respectivo cumprimento delas: a aliança.
Seguindo a observação do capítulo 2 do livro de Gênesis, a aliança estabelecida por Deus com o homem encerra e contém em si todas as prerrogativas para que a relação unilateral seja formalizada e cumprida. O homem serviria como subgerente de Deus na criação, e receberia por isso (através de sua obediência) vida eterna e o favor do Criador para sempre. Em face da quebra desse princípio, todas as maldições também prometidas foram ativadas, e assim, o homem tanto passa a ser vítima do pecado que agora faz parte de sua natureza, quanto alvo da ira de Deus por ter violado o pacto firmado pelo Soberano. No entanto, antes de a queda representar o fim do relacionamento de Deus com o homem, como vimos, o autor do livro de Gênesis demonstra que os planos do Soberano permanecem inalteráveis, e sua vontade de reservar para si um povo através do qual fará surgir o Messias que redimirá os eleitos e a criação como um todo vigoram sem quaisquer interrupções.
Após a menção ao personagem que representa essa continuação (cf. Gn 5.32 – Noé), e depois de ter elaborado um prólogo que apresenta aos leitores a situação de depravação e corrupção da humanidade, e em resposta a isso, o julgamento da parte de Deus, Noé é finalmente introduzido no cenário a fim de que por meio dele o autor demonstre o progresso dos intentos redentores do SENHOR para com sua linhagem. Os versículos de 9 a 22 são o início de toda a narrativa que elucida esse tema.
Como era de se esperar, o personagem escolhido por Deus como instrumento para dar continuidade aos seus propósitos representa um forte contraste quando comparado aos seus contemporâneos: “Eis a história de Noé. Noé era homem justo e íntegro entre os seus contemporâneos; Noé andava com Deus. Gerou três filhos: Sem, Cam e Jafé (vs. 9, 10)”. Como é sugerido por muitos estudiosos, o termo “אֵ֚לֶּה תּוֹלְדֹ֣ת” (hb. trnslt. “elêh tôledôt” = “estas são as gerações”) serve como uma divisão natural em todo o livro de Gênesis, apontando para o desenvolvimento das linhagens. Assim, tal designativo pode servir para anexar a história de Noé à narrativa precedente, bem como às que se sucederão. O contraste entre a corrupção da humanidade e a integridade de Noé ressalta a amplitude e alcance da degeneração do pecado sobre os homens, sendo o único homem justo no meio de toda uma geração (7.1).
Dos versos de 11 a 17 há uma mescla dos temas apresentados sob o auspício da narrativa de Noé, que exibem a decisão de Deus quanto a como operará a destruição e punição do pecado ao mesmo tempo em que salvará sua linhagem de tal execução. O quadro de depravação e violência da humanidade novamente são destacados como os motivos para que Deus despeje sua ira sobre o mundo (vs 11-13), ligado a isso, o SENHOR anuncia como Noé e sua família serão salvos(14 a 16) , e seguindo esse anuncio, por fim, é revelado como o juízo cairá sobre a raça humana (v. 17).
Dos versos 18 a 22, a cláusula pactual é referida, enfatizando a progressão dos planos salvíficos do Criador, assim como fora com Adão. A afirmação de uma aliança encerra a ideia de que não somente a linhagem será preservada, mas também que o relacionamento com Deus está sendo mantido.
Também é necessário perceber que o movimento realizado por Moisés no livro de Gênesis, análisa esse padrão que compreende a história de todo o povo de Deus até a consumação. Como observa Dillard:
[...] Ao enfatizar a importância do dilúvio, é possível reconhecer as conexões entre a narrativa da criação e a narrativa do dilúvio; estabelecendo, desse modo, um padrão de três partes que se move da Criação para a Não-Criação (juízo) e finalmente para Recriação. [...] Noé e sua família representam uma ligação com a ordem da antiga criação, enquanto a linguagem da liana com Noé ecoa a linguagem de Gênesis 1–2, de modo a mostrar que Noé significa, de fato, um novo começo.
Tal informação deve ser vista como crucial a fim de que entendamos que a linguagem da aliança e todo o contexto desenvolvido até este ponto do livro de Gênesis, exibem claramente que os planos de Deus sobre Noé e sua família não são apenas uma história pontual no meio da narrativa do livro, mas representam a salvação que Deus está executando de maneira tipológica nesse relato, explicitando o modo como operará a salvação de toda a linhagem que procede de Deus, bem como de todo o cosmo:
A aliança com Noé aparece no contexto do desenvolvimento [das] duas linhagens (da serpente e da mulher), e manifesta a atitude de Deus para com ambas. Destruição total e absoluta se acumulará sobre a semente de Satanás, enquanto que a livre e imerecida graça será derramada generosamente sobre a semente da mulher. A aliança com Noé une os propósitos de Deus na criação com seus propósitos na redenção. Noé, sua semente e toda a criação se beneficiam desse relacionamento gracioso.
Além de todo desenvolvimento histórico-redentivo que se segue por toda a Escritura, desenvolvendo os princípios abordados pelo texto destacado, há duas outras referências à passagem em questão no Novo Testamento. A primeira referência é a 2 carta de Pedro 2.5 que faz alusão direta ao enredo não somente a esse episódio do anúncio do juízo e salvação a Noé e sua família, mas a toda a narrativa seguinte, destacando o mesmo como tendo sido preservado do Juízo de Deus sobre a humanidade. Vale notar que a advertência realizada por Pedro está direcionada contra os falsos mestres, personagens que na Escritura são apontados como relacionados ao maligno (Jd v.5-8) por sua condenação, antítese realizada por Moisés em Gênesis destacando as duas linhagens.
E por fim a segunda referência encontra-se em Hebreus 11.7 que aponta o princípio da salvação, tal qual temos visto, como operação dos planos de Deus através de Noé.
Em termos gerais, o ponto concêntrico do texto analisado é exatamente o versículo 18, onde lemos o estabelecimento da Aliança entre Deus e Noé, que explicita o princípio que temos trabalhado até este ponto que é a progressão do controle de Deus sobre a história visando a redenção de seu povo eleito.
Após um cenário no qual é descrito a corrupção e degeneração da humanidade, à luz do padrão que vem sendo estabelecido por Moisés, agora o fluxo exposto pelo autor é demonstrar o favor do Criador para com seu povo, mantendo a promessa de uma linhagem santa que percorrerá a história até que o Messias apareça e execute a obra devida de aniquilar o mau da criação. Assim, a aliança mencionada em 6.18 e que será ratificada em 9.9, garante a preservação das condições necessárias para que o povo de Deus aguarde com grande expectativa a redenção por vir, como esclarece Robertson:
[...] A aliança com Noé pode ser caracterizada principalmente como a aliança da preservação. [...] Mediante esse decreto, Deus obriga-se a preservar a terra na sua presente ordem universal até o tempo da consumação. [...] O modo divino de tratar com o homem depois do dilúvio deve ser visto com [uma] perspectiva global em mente. O homem é depravado, inclinado à autodestruição e digno de julgamento. Mas Deus, em graça e misericórdia, determina preservar a vida do homem e promover a multiplicação dos seus descendentes.
A conclusão imediata é a de que Moisés ensinou o povo de Israel, por meio da narrativa do firmamento da Aliança de Deus com Noé, que as intenções do Criador de abençoar seus eleitos é algo inalterável ou irrevogável, e por isso, o favor do SENHOR jamais se apartará daqueles sobre quem repousam a graça de terem sido redimidos tipologicamente no êxodo; algo que aponta para a consumação da obra redentora do Criador, que glorificará seu nome sendo exaltado como SENHOR e soberano sobre tudo.
Transição
Cristo Jesus, o messias prometido, é por essa razão, o ponto central da história, pois nele, todos os propósitos salvíficos de Deus são cumpridos, garantindo ao povo eleito do SENHOR o desfecho das eras conforme pretendido por ele.
Aplicações
1. Não estamos presos num ciclo histórico maldoso, mas caminhamos para a redenção.
Observando o mundo em que vivemos e a história que se processa a cada dia, somos tentados a achar que os acontecimentos do presente século encerram nossa realidade em termos de que jamais sairemos desse poço horrendo no qual o pecado nos atirou. Dia após dia, só o que lemos e ouvimos é o aumento da criminalidade, da corrupção e da depravação dos homens.
Por causa disso, é tentador para nós muitas vezes assumirmos uma postura apática, simplesmente contanto com a sorte dia após dia, de não sermos vitimados pela maldade e crueldade da geração com quem convivemos. Mas a partir de Gênesis 6.9-22, o SENHOR nos lembra que a história não é um ciclo maligno de pecado que nunca terá fim, tendo como finalidade última o viver em eterna agonia e desespero. Desde Gênesis 1 o Criador disparou um flecha, que certamente atingiu e atingirá seu alvo: a glória do nome dEle através da salvação de seu povo eleito, e da destruição e punição do pecado.
Descansar nosso coração nessa promessa é mais do que uma alívio, é um imperativo. Devemos viver não à luz da maldade e da degeneração do pecado, mas de acordo com a promessa bíblica de salvação, mesmo em meio ao juízo que recai sobre o mundo. “Eles se encurvam e caem; nós, porém, nos levantamos e nos mantemos de pé” (Sl 20.8). Nosso olhar não está fito nesse mundo tenebroso que se decompõe pouco a pouco, mas nas mãos do SENHOR da história que rege com vara de ferro as ações dos homens, e nos têm reservado o gozo da sua salvação.
2. A aliança com Deus é a garantia de nossa salvação.
Ligado a isso, devemos nos lembrar do teor através do qual foi garantida a preservação da semente da mulher: a aliança estabelecida por Deus. O SENHOR que não mente, comprometeu-se soberanamente em realizar a sua obra salvífica para nós e em nós. Aquele que jamais empenha sua palavra frivolamente, garantiu-nos por meio de um pacto a salvação eterna, e jamais poderia voltar atrás pois sua natureza é reta e pura.
A aliança estabelecida por Deus o Pai com seu Filho Jesus Cristo é o aio que nos assegura o favor do Criador redimindo-nos de nosso estado de miséria através do Messias prometido. Muito maior do que Noé é aquele que nos abençoa com o comprimento da promessa de Gn 3.15: o esmagar da cabeça da serpente não foi apenas um acontecimento histórico, foi o cumprimento do pacto feito por Deus, reservando-nos para o dia final, quando seu nome será glorificado, e nós, seremos de uma vez por todas, libertos de nossa miserabilidade, desfrutando do Reino celeste.
Por isso, nossa confiança não repousa na aparente inconstância da história, mesmo porque, como agora sabemos, ela não é inconstante, mas segue o curso traçado pelo próprio SENHOR. Mas descansamos no compromisso firmado soberanamente por Deus, em fazer seu nome ser magnificado por toda a criação, por meio da destruição do mau, e salvação de seus eleitos.
Conclusão
O avanço e desenvolvimento dos planos redentores do SENHOR Deus jamais poderão ser frustrados, e o objetivo dos mesmos serão atingidos: a glória do SENHOR na salvação de seu povo é algo inevitável. Que grande promessa nos fora feita, e que grande desfecho nos aguarda: o novo céu e nova terra nos está assegurado, pois o SENHOR da aliança está no leme da história, guiando o mundo para o cumprimento da sua vontade.
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